Monday, February 04, 2008

Meu boletim do quarto ano primário

Sexta passada, minha mãe me deu um belo presente, o boletim que registra minha vida escolar no Grupo Escolar Coronel Francisco Martins, lá da Franca, ano de 1956. Os dados mostram um aproveitamento medíocre. Fui aprovado com a nota sete. Em 1956 recebi, nos dez meses letivos, sete setes, dois seis e meio, e um seis. Como vêem, meu quarto ano de grupo escolar não é um período de brilho acadêmico. Nada do que orgulhar-se.
Mas não dou essa notícia apenas para mostrar minha mediocridade. Ao ver meu velho boletim, lembrei-me do nosso fantástico professor, Seu João Madureira. Ela nos via com crianças amadurecidas precocemente, dada a dura realidade da grande maioria de seus alunos, gente pobre que, logo após o primário, iria trabalhar nas fábricas de sapato da Franca. Por isso conversava conosco como se fôssemos adultos que deviam compreender certas verdades da vida.
Um dia João Madureira nos falou sobre notas. Disse-nos que elas não retratavam necessariamente inteligência ou capacidade. Mostrou que alguns alunos (o Mendonça, filho de professora por exemplo) tinham boas notas porque recebiam muito apoio familiar. Além disso, tinham onde estudar em casa. E concluiu dizendo que qualquer um de nós, caso nos fossem dadas oportunidades, poderia fazer ginásio e colegial. Nossas notas não retratavam o que éramos capazes de fazer.
Acho muito improvável que algum professor de 4° ano tenha conversas com essa com seus alunos nos dias de hoje. Talvez nem ele nem seus alunos tenham consciência clara das determinações de classe sobre a vida escolar das crianças. Eu tive sorte. Fui aluno do Professor João Madureira.

2 comments:

Sindy said...

Olá professor Jarbas
Lendo seu post lembrei das minhas turmas de 4ª série (do 'antigo' Fundamental de 8 anos) em uma escola situada na periferia da cidade. Cerca de 50% das turmas tinham alunos entre 12 e 14 anos... uma dura realidade que comprova uma crença da educação: reprovar ainda é um bom remédio! Uma pena! Mas lágrimas a parte, sempre procurei trabalhar na perspectiva de que eles poderiam superar aquela condição com esforço próprio. Independente das dificuldades, sonhar era permitido, assim como planejar maneiras de concretizar seus desejos. Fico feliz em saber que muitos daqueles alunos já estão no Ensino Médio, alguns terminaram o Fundamental na EJA,... outros, porém, cairam na marginalidade. De qualquer forma, quando deito minha cabeça no travesseiro, tenho aquela sensação de dever cumprido, pelo menos, fiz o que me era possível naquele momento.
E penso que, se outros professores como o João Madureira acreditassem verdadeiramente no potencial dos seus alunos, teríamos adultos mais capazes de enfrentar a vida!
Grande abraço
Sintian

Fátima Campilho said...

Também tenho a minha caderneta escolar, Jarbas, com boas notas e lembranças.
Abraços.